O tempo de espera
O sol principiava com os seus raios no horizonte, a barra do dia apontava-se com a cara no mundo as cinco e meia da manhã daquele dia dezenove de novembro, ano da graça, 1964. Raísa assustada deu um soco no relógio como se fosse a própria cara, levantou-se rapidamente e foi acordar o marido, esquecera de colocar o despertador ligado. A passagem fora comprada com uma semana de antecedência. Era impertivo que viajassem.
Apressados trocaram-se, tomaram café pelos olhos e narizes, e saíram em direção à estação de trem. Num átimo estavam lá, já haviam feito a parte que lhes cabiam, teriam apenas de esperar. Sentaram-se e, com a respiração ainda ofegante, aguardaram o comboio das seis.
Oito horas, na fisionomia a ansiedade pela viagem, o trem não chegara no horário. Era possível que atrasasse, naquele tempo havia muitas mudanças, mandos e desmandos.
O sol já começava a arder nas costas dos lavradores que capinavam o milharal em frente à plataforma número cinco.
- Dez horas! - disse um cidadão a um menino que ali passava em direção à escola e nada de trem.
Viram pessoas indo ao trabalho, portas abrindo, pássaros deslocando de um lado a outro. O trem eles não viam. Colocavam uma das mãos na testa como aba de boné como se este ato aumentasse a visão e olhavam demoradamente para o longe da linha férrea. Nada de trem. Incrédulo, internamente não aceitavam que o mesmo trem que viram passar por tantas vezes e quase que pontualmente, não aparecer, achavam que poderia ser azar, quase nunca saíam de casa. O esposo chegou a pensar num possível desastre. Se fosse saberia. O chefe da estação passara por eles várias vezes e não mencionara a palavra desastre. Apenas dizia ser atraso.
A fome apoderou-se de Hermínio, que sentado no banco, pôs-se a abrir a sacola. Dela retirou alguns bolinhos. Comeu-os vagarosamente com o olhar perdido na distância, o barulho do mastigar entrava na sua cabeça como o rodar do trem nos trilhos, era tão devagar como se triturassem os bolinhos e os trilhos. Desviou o seu olhar para onde se via dois lavradores que descansavam à sombra de uma goiabeira. Já passavam das quinze horas.
A esposa nem dizia nada. Acostumara-se a ditadura do lar. Pouco era ouvida e já se acostumara com os atrasos. Só confirmara as afirmações do marido, sempre foi assim, seria assim. O trem era mais ou menos como o marido, as vezes vinha para casa e as vezes se atrasava nos botecos da vilinha e as vezes nem vinha.
Às cinco da tarde, o chefe da estação os avisou que num determinado trecho, perto da cidade de São Roque, estavam recolocando uns dormentes que tinham sido arrancados pela chuva e que só retornariam à normalidade no dia seguinte.
Na manhã seguinte, às seis horas, os dois retornaram à estação e tomaram o trem com destino à Sorocaba.
(Santiago Derin)
O sol principiava com os seus raios no horizonte, a barra do dia apontava-se com a cara no mundo as cinco e meia da manhã daquele dia dezenove de novembro, ano da graça, 1964. Raísa assustada deu um soco no relógio como se fosse a própria cara, levantou-se rapidamente e foi acordar o marido, esquecera de colocar o despertador ligado. A passagem fora comprada com uma semana de antecedência. Era impertivo que viajassem.
Apressados trocaram-se, tomaram café pelos olhos e narizes, e saíram em direção à estação de trem. Num átimo estavam lá, já haviam feito a parte que lhes cabiam, teriam apenas de esperar. Sentaram-se e, com a respiração ainda ofegante, aguardaram o comboio das seis.
Oito horas, na fisionomia a ansiedade pela viagem, o trem não chegara no horário. Era possível que atrasasse, naquele tempo havia muitas mudanças, mandos e desmandos.
O sol já começava a arder nas costas dos lavradores que capinavam o milharal em frente à plataforma número cinco.
- Dez horas! - disse um cidadão a um menino que ali passava em direção à escola e nada de trem.
Viram pessoas indo ao trabalho, portas abrindo, pássaros deslocando de um lado a outro. O trem eles não viam. Colocavam uma das mãos na testa como aba de boné como se este ato aumentasse a visão e olhavam demoradamente para o longe da linha férrea. Nada de trem. Incrédulo, internamente não aceitavam que o mesmo trem que viram passar por tantas vezes e quase que pontualmente, não aparecer, achavam que poderia ser azar, quase nunca saíam de casa. O esposo chegou a pensar num possível desastre. Se fosse saberia. O chefe da estação passara por eles várias vezes e não mencionara a palavra desastre. Apenas dizia ser atraso.
A fome apoderou-se de Hermínio, que sentado no banco, pôs-se a abrir a sacola. Dela retirou alguns bolinhos. Comeu-os vagarosamente com o olhar perdido na distância, o barulho do mastigar entrava na sua cabeça como o rodar do trem nos trilhos, era tão devagar como se triturassem os bolinhos e os trilhos. Desviou o seu olhar para onde se via dois lavradores que descansavam à sombra de uma goiabeira. Já passavam das quinze horas.
A esposa nem dizia nada. Acostumara-se a ditadura do lar. Pouco era ouvida e já se acostumara com os atrasos. Só confirmara as afirmações do marido, sempre foi assim, seria assim. O trem era mais ou menos como o marido, as vezes vinha para casa e as vezes se atrasava nos botecos da vilinha e as vezes nem vinha.
Às cinco da tarde, o chefe da estação os avisou que num determinado trecho, perto da cidade de São Roque, estavam recolocando uns dormentes que tinham sido arrancados pela chuva e que só retornariam à normalidade no dia seguinte.
Na manhã seguinte, às seis horas, os dois retornaram à estação e tomaram o trem com destino à Sorocaba.
(Santiago Derin)
e mais não é preciso, não é mesmo? quando o amor, ou a paixão, assim bastam.
ResponderExcluirmuito muito bonito, e tão verdadeiro!
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